RETRATOS de LITERATURA ILUSTRADA - Prosa & Poesia & Fotografia
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
Hábitos & compromissos
Filósofos já discutiram, biólogos e antropólogos já pesquisaram: somos seres de hábitos. Em linguajar tecnológico, há um mecanismo de inserção de memória que preenche nosso HD e que vai rodar, depois, num átimo, bastando apertar "play".
Distinguindo-nos dos aparelhos de teclas, telas e botões, a máquina humana instala esses programas pela repetição. Somos apresentados a alimentos, atividades físicas, bebidas, drogas... e "não podemos mais viver sem eles". Da mesma maneira, não somos apresentados a alimentos, atividades físicas, bebidas, drogas... e podemos viver sem eles. O contato é a porta do hábito. A repetição o enraíza.
A experiência deflagra sensações positivas ou negativas, impulsionando-nos ou não à novas buscas e reincidências. Naturalmente as provas positivas têm mais facilidade de promover adesão. Uma sensação de prazer imediato, sem esforço, cativa o cliente e pode rapidamente estabelecer-se como rotina. Também torná-lo dependente... para o bem ou para o mal.
Não nascemos totalmente carnívoros ou estritamente vegetarianos. Somos abastecidos de leite e assim plenamente satisfeitos... até o ponto em que iniciamos o passeio pelas feiras da oferta e da escolha. Crescimento e desenvolvimento requerem elementos complementares e assim adentramos outro universo alimentar, em que pesam as culturas. Mas e se, por exemplo, a farinha não nos fosse ofertada, ou se jamais experimentássemos o arroz ? O adulto que "não pode passar sem eles" é do mesmo tipo do que "não pode passar sem carne" ou "não consegue viver sem pão".
Nossas necessidades são múltiplas e muitas são as vias pelas quais é possível supri-las. Evidentemente a bagagem pessoal, características de personalidade, cultura e educação atuam muito na formatação do quadro, mas pesam também sobremaneira o estado emocional e a oferta "da hora", como tintas fortes, com poder de manchar, estragar toda pintura.
Nossa natureza agradece o fácil, sonha, anseia pelo imediato, bate palmas de contentamento diante de resultados instantâneos. Assim, se obtivermos o almejado sem a obrigatoriedade de espera ou esforço, tanto "melhor". Isso desenha a forma com que nos habituamos a determinadas coisas e a outras não. Os elementos catalisadores dessas reações são eminentemente recorrência, dedicação e persistência.
Uma vez que a sensação de bem estar, tão desejada - seja lá como a entendamos num determinado momento - seja atingida através de uma tragada ou de um gole, naturalmente nos dirigiremos mais prontamente à sua reprise. Em contrapartida, o que pede mais tempo para promover efeito pende a ser relegado.
Uma vez que tenhamos experimentado, por exemplo, as benesses de meditar, muito provavelmente não nos sentiremos atraídos ao consumo de energético algum que prometa "te dar asas" numa latinha. Ao perceber ser possível voar por si só, apenas com as ferramentas da mente, drogas sequer serão cogitadas para o repertório pessoal.
É verdade que não se pode afirmar gostar muito, pouco ou nada de alguma coisa sem tê-la provado. Mas há o que não seja imperativo provar para preferir evitar e o que tudo indique valer a pena. A ciência nos ajuda nisso. Ouvir o que o corpo fala e o que a emoção sinaliza também deve contar. Informação é, sim, algo a beber... e exercitar... de preferência para o bem.
Nesse amplo cenário a maior ferramenta do adulto para implantar mudanças, alterar hábitos, reescrever histórias talvez esteja na palavra compromisso. Algo a estabelecer consigo mesmo quando a intenção é a do BEM.