RETRATOS de LITERATURA ILUSTRADA - Prosa & Poesia & Fotografia
quinta-feira, 4 de setembro de 2014
Fotografia
Apenas mirar, apontar, disparar ?! Isso pode ser... registro. Fotografia é abraço, encontro intenso, não importando se em instante. Processa-se troca, câmbio, há envolvimento. O ser que enverga, assume a máquina, enamora-se, corteja o objeto de desejo. Fugazmente faz romance. Encanta-se... sequestrado, abduzido pela ação, sendo refém do efêmero, ansiando sorvê-lo antes que escape. E troca olhares, examina o alvo. E procura posições mais favoráveis à consumação do ato. Explora perspectivas, aspectos, faces... que valorizem o envolvimento. Que permitam parto apurando produto, parindo filho forte.
Apenas mirar, apontar, disparar ?! Uma imagem pode ser apenas isso, uma estampa. Ou ser fruto de prazer, consequência de entrega, de desfrute, de paixão. Um registro mostra... o que todo mundo vê. Uma fotografia revela um quê a mais, imprime presença. Algo que é ainda pouco diante da bagagem que carrega. Porque entrega apenas parcela, pedaço do que porta. Porque fica, com quem faz, uma mala invisível de pertences importantes. Relevantes a ponto de acordar-lhe mais desejo, estimular-lhe o apetite, incitá-lo a insistir, colocá-lo nessa senda.
E o que seria fotografia ?
Um exercício, brincadeira séria, diversão com desafio... e com prêmio de prazer ! Ante à lente uma meta: melhorar. No gatilho o laço, a linha, o anzol a fisgar peixe, capturar caça, sem contê-los, possuí-los. Em movimentos rápidos, o mais habilmente possível, ideal ir além de documentação. Não sê-lo só. Apoderar-se subjetivamente do ente à frente, aproveitando as alternativas dos dois. Com atenção, tentar... controlar variáveis, contornar surpresas, em feito de conquista. Assim, viajar por ângulos, ausências, sombras, luzes, composições... de modo a conduzir, reger presente, produzindo algo novo... a partir do existente. Ah, praticar a arma do olhar !...
E o que seria fotografia ?
Um mergulho no momento, uma espécie de comunhão. Ante à lente, um mundo imenso, particular, que se anseia registrar, capturar essencialmente, no espaço de um instante. Diante da câmera, um objeto de cobiça, algo que instiga, emociona, desperta... alguma admiração. Independente de tamanho, número, gênero do sujeito, é ensejo único: agora sem repetição. Um átimo altera tudo. Muito ou pouco adiante e... nada é como antes, o mesmo não virá logo a seguir. O vento sopra, a luz muda, modelos cansam, murcham... pose, sorriso. Desfaz-se a mímica, o movimento, a mágica. O depois nunca é capaz de conter o impulso primeiro: deixa escapar o original. Pode até admitir o seguinte, pode até gerar fruto ainda mais doce. Mas não aquele, sonhado antes. Não mais. Jamais !
E o que seria fotografia ?
Há quem ache que imagem pode ser trabalhada... depois, manipulada por programa de computador, virtualmente retocada, e ainda se chamar fotografia. Talvez uma questão de semântica, falta de nome novo para o produto pirata, que falsifica o genuíno. Material esse que pode, sim, exprimir o belo, dar show de bola mas... ah, arte não pode ser ! Ou computador virou artista.
Há quem ache que imagem pode ser trabalhada... durante, no ventre, no momento flagrante... sendo assim fruto de dentro, único, e por isso arte: filho legítimo de criação. Porque dom e inspiração não vertem de máquina - que pode fazer bonito em massa, com técnica, mas não é capaz de exercitar os sentidos e parir com emoção.
Há quem ache que em fotografia sentimento é um fundamento. E mergulhe em cada click, viva intensamente cada encontro, a mágica do momento... nessa relação de paixão.