RETRATOS de LITERATURA ILUSTRADA - Prosa & Poesia & Fotografia
domingo, 7 de setembro de 2014
Penas & Voos
Pena... que o texto jamais revele o que o sustenta, o todo anterior, subjacente ao resultado !
Pena... que a leitura só margeie a criação. Porque produto é superfície exposta, e o antes, que o precede, esconde mundos de emoções !
Pena... que aquele que lê não acesse esse instante, não possa estar presente à nascente, momento de mágica da escrita !
Pena... que não possa compartilhar esse ensejo, gozar esse flagrante pré histórico, o durante, o conjunto: viver o mesmo que o inventor !...
Pena... que quem vê só apanhe o pronto, no pós parto. Não palpe o embrião, não toque o ponto de partida. Encontre-se só com a capa, nata do leite que, antes, fervente, borbulha em calores de essências, teores que precisam derramar.
Pena... que quem lê não esteja junto... na mente, no coração do agente, compositor. Desse ente que pulsa, que exclama... dúvidas, credos, sentimentos... em chamas de incêndio, tempestades de conteúdo interior.
Pena... que página e tela sejam rasas, apenas quadros de piscinas... enquanto autor está no mar, em ondas, aparecendo apenas em pontas da tanta água que nada.
Pena... que só se possa divisar, bem de longe vislumbrar, o abissal fundo do oceano de quem cria. Só possível idear remotamente, supor somente sobre todo esse sentido de escrever !...
Pena... que o leitor não constate, não repute na pele, não conheça em seu corpo o âmago dessa experiência !
Porque a ação de produzir é êxtase, espaço de encanto, amostra de muito, pedaço do tanto que esse ser pode verter. Porque é afluente, manancial, mina, vazante... de dor, de crença, de amor, de vivência que condensa... em apanhados de palavras, frases, sentenças. Extratos que em imagens, prosa e verso, vestem a vida.
Ah, a criação é enlevo e alento por onde marcha essa alma em missão ! Porque o que alimenta, move, preenche, sustenta... é o ato, o andamento ao feito. Esse momento é o sonho, é a droga, é o remédio, é a graça: o paraíso que tem chão. Quando compõe o escritor desfaz infernos, cria asas, ascende ao céus, conhece o éden. Equilibra-se... em pleno ar. É livre, pode voar !...